quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Existe linguagem animal?

Nosso primeiro 'post' destina-se a abordagem do tema Linguagem Humana x Linguagem Animal. Abordamos o assunto na última aula de Epistemologia da Linguística, e agora vou tentar resumí-lo aqui.
Será que existe uma linguagem entre os animais? Se sim, em que esta se assemelha com a linguagem humana, e quais as diferenças entre as duas?

No capítulo 5 da obra de Émile Benveniste 'Problemas de Linguística Geral I', esse assunto é abordado. Benveniste nos expõe, nesse capítulo, que Karl von Frisch foi o responsável por estabelecer soluções à essas questões. Em suas pesquisas ele analisa o processo de comunicação entre as abelhas: a abelha-obreira, depois de encontrar uma fonte de alimento e saciar-se, volta à colmeia e passa a informação às outras abelhas da colméia, por meio de danças. São duas danças: uma circular, em que ela traça círculos horizontais da direita para a esquerda e vice-versa, e uma em forma de oito, em que a abelha, por meio de uma vibração do abdômen, segue em linha reta, faz uma volta completa à esquerda, segue em linha reta novamente e recomeça uma volta completa para a direita, e assim sucessivamente.
Depois de presenciarem essas danças, as outras abelhas seguem em direção ao local em que a primeira abelha se saciou, e depois de saciar-se também, retornam à mesma colméia e retransmitem a mesma informação, com as mesmas danças, gerando outra partida de abelhas.
Karl percebeu então que essas duas danças eram verdadeiras mensagens que anunciavam a descoberta de alimento para a colméia: o odor da obreira permite a descoberta da natureza do alimento e as danças permitem a descoberta do local em que ele se encontra.
A dança circular indica que a fonte de alimento deve ser procurado à pequena distância. A dança em forma de oito, indica que a fonte está situada a uma distância superior. A mensagem comporta duas indicações: a distância e a direção que as abelhas devem tomar para encontrar o alimento. A distância está indicada no número de figuras desenhadas num tempo determinado; a direção a ser seguida é dada pela direção da linha reta em relação à posição do sol.

Num primeiro momento podemos pensar então, que existe mesmo uma linguagem animal, porém, se pararmos para analisar os aspectos que caracterizam a linguagem veremos que estamos errados. Apesar da comunicação entre as abelhas ser extremamente precisa, ela não constitui uma linguagem e sim um código de sinais. Mas porque um código de sinais?
  • As abelhas são capazes de compreender uma mensagem como vários dados e manter na memória informações sobre a posição e a distância do alimento; 
  • Elas produzem essa mensagem através de símbolos, ou seja, simbolizando esses dados através das danças.
Vemos que há simbolismo, ou seja, as abelhas tem a capacidade de formular e interpretar um signo e também de reter na memória a informação e analisá-la, e, além disso, essa comunicação vale no interior de uma mesma comunidade e todos os seus membros estão aptos a empregá-la e compreendê-la igualmente. No entanto não são só essas características que determinam o que é linguagem.
Existem diferenças enormes entre a comunicação entre as abelhas, e a linguagem humana, como por exemplo, não há intervenção de um 'aparelho vocal' na formulação da mensagem, visto que essa se dá exclusivamente pelas danças, ao contrário da linguagem humana, em que um 'aparelho vocal' se faz essencial; a mensagem da abelha não provoca respostas, ou seja, não há diálogo; a abelha não constroe uma mensagem a partir de outra mensagem, a comunicação se refere à um dado específico, ao contrário da linguagem humana que se caracteriza por oferecer um substituto à experiência; o conteúdo da mensagem é único, não ilimitado, e a mensagem das abelhas não se deixa decompor em elementos menores para ser analisada.

A propriedade mais fundamental na linguagem humana é a de articulação, não presente no sistema de comunicação entre abelhas, que permite que uma infinidade de mensagens novas sejem construídas a partir de um número limitado de elementos sonoros distintivos.

Vimos então, que não existe de fato uma linguagem animal, e sim, apenas um código de sinais, que mostra-se eficiente dentro da sociedade das abelhas, por exemplo.


Fontes: Introdução á Linguística: I.Objetos teóricos (José Luiz Fiorin);
            Problemas de Linguística Geral I (Émile Benveniste)

3 comentários:

  1. Há chimpanzéns que aprenderam linguagem de sinais, pode ser considerada uma linguagem animal, por mais que seja utilizadas por culturas surdas essa linguagem?

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    1. Acredito que não. LIBRAS não é meramente uma linguagem, é uma língua com estrutura e gramática própria. É, inclusive, uma das línguas oficiais do Brasil. O que os chimpanzés aprendem é mímica apenas.

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